"Ser Steve Jobs ou Bill Gates nos
EUA é fácil. Difícil é ser o Nélio Nicolai no Brasil."
É assim que o homem que é considerado
o "professor Pardal" de Brasília define o que considera sua luta
"solitária" e "desgastante" em busca do reconhecimento da
autoria de várias invenções.
Um dos inventos que constam de sua
lista é usado no dia a dia pela maioria dos brasileiros: o identificador de
chamadas, ou Bina.
Nicolai, 72, disse que o identificador
foi construído no final da década de 70 em uma antiga máquina de calcular
-nessa época ele era funcionário da Telebrás, empresa pública de telefonia,
privatizada anos depois.
O invento é motivo de disputa judicial
há 14 anos. Nicolai afirma que registrou o identificador pela primeira vez no
início dos anos 80. A patente é de 1992.
Todas as operadoras de telefonia do
país usam mecanismos identificadores de chamadas e Nicolai resolveu travar uma
disputa jurídica: moveu processos contra a Claro, a Vivo, a CTBC e a Sercomtel.
O processo contra a Claro terminou em março, após um acordo milionário.
Nele, Nicolai desistiu de ações na
Justiça contra a operadora e abriu mão dos direitos autorais em troca de um
valor, que não pode ser divulgado por causa de cláusula de confidencialidade.
Em uma outra batalha, um juiz de
Brasília reconheceu a patente de Nicolai em um processo contra a a Vivo, a CTBC
e a Sercomtel, condenando as a empresas a pagar ao inventor 20% do que cobram
dos usuários pelo uso do identificador.
Enquanto não houvesse o julgamento
deste recurso, uma liminar concedida pelo juiz obrigava que 10% desse valor
cobrado dos usuários fosse depositado em uma conta judicial. A Vivo recorreu em seguida da decisão
e essa liminar foi suspensa por um desembargador do Tribunal de Justiça do
Distrito Federal. O mérito ainda pode demorar para ser julgado.
De acordo com Nicolai, as empresas
deveriam pagar royalties pelo uso do sistema "há quase 20 anos".
Segundo o advogado de Nicolai, Luis
Belmonte, a ideia é processar todas as companhias telefônicas no país. Em caso
de êxito, o plano é buscar royalties internacionais a que ele garante ter
direito.
As operadoras apontam que o reconhecedor
de chamadas dele funcionava em um sistema obsoleto, que não se aplica às redes
de telefonia móvel de hoje.
Hoje, o inventor mora em uma casa em
Brasília, mas foi criado atrás do balcão de um bar de Belo Horizonte, do qual o
pai era dono. Mais velho, se formou em uma escola técnica. Atrasou os estudos
por conta do bar e por ter sido jogador das divisões de base do Cruzeiro. De sua lista de invenções fazem parte
um aparelho que permite à pessoa fazer apostas de jogos lotéricos em caixas
eletrônicos e outro que avisa o departamento de trânsito quando o carro passa a
velocidade da via.
OUTRO LADO
A operadora Vivo negou que use o Bina
inventado por Nélio Nicolai em suas linhas telefônicas. A empresa afirma que
usa uma tecnologia diferente, da qual detém os direitos autorais. A empresa informou ainda que os
efeitos da patente do Bina estão suspensos por uma decisão judicial, e que há
um processo pedindo a nulidade do registro.
"A suposta invenção de Nicolai é
posterior a outras invenções de identificadores de chamadas, motivo pelo qual
existe processo em andamento para que seja declarada a nulidade da
patente". A Vivo alega ainda que a patente do
Bina não se aplica à telefonia móvel. De acordo com a empresa, o registro de
Nicolai se refere a um aparelho que, acoplado a telefones fixos, identifica o
número que fez a chamada. A Vivo, que presta serviços de
telefonia móvel, afirma utilizar um programa eletrônico que não é abrangido
pela patente. A empresa contestou ainda o cálculo da
indenização determinada pelo juiz de primeira instância, feito sobre o valor
cobrado de cada cliente pelo uso do identificador de chamadas.
"O serviço de identificação de
chamadas não é -e nunca foi- cobrado dos clientes de celulares", afirma a
Vivo. A empresa cita o exemplo dos clientes
pré-pagos: "Neste caso, mesmo ficando vários meses sem utilizar o
aparelho, o cliente continuará a desfrutar do serviço de identificação, sempre
disponível, quando receber ligações".
OUTRAS OPERADORAS
A Claro se negou a comentar o caso e
os termos do acordo.
A Folha obteve parte do documento em
que o Nicolai renuncia a processos anteriores movidos contra a Claro e também
abre mão de ajuizar novas ações cobrando royalties decorrentes do uso do Bina
pela empresa. A Algar Telecom, empresa detentora da
marca CTBC, informou que não irá comentar o assunto.
A Sercomtel informou que se
pronunciará apenas quando houver "decisão definitiva da Justiça".
Consultada pela reportagem, a Anatel
(Agência Nacional de Telecomunicações) não se manifestou até o fechamento desta
edição.
Em um documento de 2005, a agência
afirma que não há "interesse público" na discussão jurídica dos
royalties entre Nicolai e as telefônicas, e que por esse motivo não iria emitir
opinião no processo.
Fonte: Folha de S. Paulo
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